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Especialistas questionam método de contagem do coronavírus no Brasil e temem número muito maior de doentes

OMS recomenda testes em larga escala, mas país adota critério diferente

O número oficial de doentes com coronavírus no Brasil já é suficiente para despertar alerta entre a população e autoridades, mas tudo indica que ainda está longe de retratar a real dimensão da pandemia em solo nacional.

Especialistas em infectologia afirmam que a decisão do país de testar apenas parte dos casos – estratégia oposta à recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de exames em larga escala – impede um mapeamento mais preciso da covid-19 e pode reduzir a eficácia da prevenção. Estimativas apontam que a quantidade real de pacientes poderia ser até 10 vezes superior ao registrado pelo Ministério da Saúde, mas é muito difícil calcular essa margem de erro com segurança.

Na segunda-feira (16), o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, ressaltou a importância da realização de testagens em massa entre a população:

— A mensagem central é: testar, testar e testar. Você não consegue parar essa pandemia se não souber quem está infectado. Essa é uma doença séria.

Até a tarde desta terça-feira (17), o Brasil contava 291 casos, mas especialistas acreditam que o número real seja muitas vezes maior justamente pelo fato de o país não seguir essa recomendação. Em casos onde já há transmissão comunitária (em que não é possível rastrear a origem da infecção), casos de Rio e São Paulo, a orientação federal é priorizar os exames em pacientes graves. Também não há a realização de testes em larga escala no país – medida adotada com sucesso para conter a disseminação do vírus em países como a Coreia do Sul.

— A meu modo de ver, é uma forma de administrar a miséria. Se não há kits suficientes para todos, você tem de adequar os números à sua possibilidade. Assim, vão ser confirmados apenas os diagnósticos dos casos mais sérios — analisa o consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Wladimir Queiroz.

Uma das consequências disso é a dificuldade para definir o quanto a doença já se alastrou e onde. O presidente da Sociedade Riograndense de Infectologia, Alexandre Vargas Schwarzbold, lembra que cerca de 80% dos pacientes desenvolvem sintomas menos intensos e podem não ser diagnosticados, o que já favorece uma primeira subnotificação. Além disso, como em algumas regiões do país os testes estão levando mais de 72 horas para ficarem prontos, e há uma janela de mais um dia até os dados das secretarias estaduais serem tabulados pelo Ministério da Saúde, o retrato oficial embute outra defasagem.

— É possível que o número real de doentes seja até 10 vezes maior do que o divulgado. Enquanto o governo informava pouco mais de 200 infectados, podíamos na verdade já ter algo próximo de 2 mil pessoas com o vírus — estima Schwarzbold.

Exames por amostragem seriam opção

O infectologista do Hospital de Clínicas e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Luciano Goldani afirma que é praticamente impossível saber qual a dimensão exata da covid-19 no país hoje. Uma maneira de driblar a escassez de kits de testes seria realizar exames por amostragem em alguns postos de saúde, chamados “sentinela”. A descoberta de um caso por esse método poderia indicar com antecedência, pelo menos, que já existe transmissão comunitária em uma região.

— Quanto melhor você dimensionar uma doença, melhor consegue administrar — diz Goldani.

Schwarzbold acrescenta que, quando muitas pessoas são testadas, isso também pode revelar pacientes assintomáticos ou com poucos sintomas. Essa atitude favorece que eles redobrem as precauções para não passar o vírus adiante. Apesar das possíveis distorções da estatística governamental, os especialistas afirmam que é importante seguir monitorando os casos mais graves para ajustar a oferta de leitos hospitalares para esses pacientes.

— Nós não temos noção do todo, mas seguir contando pelo menos os casos graves é importante para estimar quantos vão precisar de hospital e UTI. Para os demais, é importante tomar todas as precauções para o pior cenário — observa Queiroz.

O Ministério da Saúde informou que, após a manifestação da OMS, avalia aumentar o número de análises para diagnóstico do coronavírus no Brasil por meio da importação de testes rápidos.

“Tive sintomas e não fui testada”, relata turista que esteve na Itália
Moradora de Porto Alegre, a jornalista Daniela Poli Andreini, 52 anos, passou 40 dias na Itália – um dos atuais epicentros da pandemia de coronavírus – e apresentou sintomas respiratórios dois dias depois do desembarque, realizado em 8 de março. Até esta terça, ela seguia com tosse e alguma dificuldade para respirar, mas, mesmo tendo recorrido ao sistema de saúde da Capital, não sabia se estava com coronavírus ou não.

— Tive sintomas após chegar da Europa e fui até o Posto Modelo na sexta-feira (13), mas não fui testada. Decidi entrar em isolamento por conta própria — conta Daniela, que segue em autoexílio.

Segundo a jornalista, ela passou por um exame com uma profissional de saúde e uma entrevista. Contou que havia estado na Itália, mas teria sido dispensada sem coleta de material por não ter apresentado febre no momento do atendimento – embora tenha relatado a ocorrência desse sintoma nos dias anteriores.

Dois laboratórios privados informaram que não poderiam realizar as análises. No momento, ela tenta solicitar uma coleta domiciliar à prefeitura. Por meio de nota, a Secretaria Municipal da Saúde se manifestou sobre a situação de Daniela. Confira a íntegra:

“Todos os casos são analisados tecnicamente. A análise de necessidade de testagem é baseada no paciente se encaixar em critérios clínicos estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde. O isolamento domiciliar visa não somente coibir a proliferação de coronavírus, mas também de outros problemas respiratórios. Contudo, caso exista alguma dúvida sobre a conduta de profissionais de saúde, solicitamos que a denúncia seja realizada através do 156, canal oficial para registro de demandas e investigação de casos”.

*Fonte: GaúchaZH.

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